sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

"O Que Eu Fiz?" - Um Balanço Espiritual de Fim de Ano (Inédito - C.H.Spurgeon)


Nº 169
Sermão pregado na manhã de Domingo, 27 de Dezembro de 1857
por Charles Haddon Spurgeon
No Music Hall, Royal Surrey Gardens, Londres.


"O que eu fiz?" Jeremias 8:6 [1]


Talvez nenhuma outra figura que represente Deus sob uma luz mais agraciada, que essas figuras de linguagem que O mostram inclinando-se do Seu trono, e descendo do céu para suprir as necessidades e considerar as aflições da humanidade. Temos que amar esse Deus que, quando Sodoma e Gomorra transpiravam iniquidade, não queria destruir essas cidades, ainda que conhecesse sua culpa e sua maldade, até que não as tivesse visitado e transitado durante um tempo por suas ruas.

Penso que não podemos evitar derramar nosso coração em afeto por esse Deus, que inclina Seu ouvido desde a glória mais sublime, e o põe junto ao lábio do mais fraco indivíduo que expresse um desejo sincero.

Como poderíamos resistir ao sentimento que Ele é um Deus a quem devemos amar, quando sabemos que presta atenção a tudo o que diz respeito a nós, que conta os próprios cabelos de nossa cabeça, que pede aos anjos que protejam nossos passos para que nossos pés não tropecem nas pedras, que sinaliza nosso caminho e ordena nossos caminhos?

Mas esta verdade grandiosa se achega especialmente ao coração do homem, quando recordamos quão solícito é Deus, não meramente no que se refere aos interesses temporais de Suas criaturas, mas sim no concernente aos seus interesses espirituais. Deus é representado na Escritura como “aguardando para abençoar”, ou, na linguagem da parábola, como vendo a Seus filhos pródigos ainda quando estão longe, correndo e jogando-se em Seu pescoço e beijando-os. Ele está tão atento a tudo o que é bom no coração do pobre pecador, que para Ele há música em um suspiro, e beleza em uma lágrima; e neste versículo que acabo de ler, Ele se representa como vendo o coração do homem e escutando: escutando como se pudesse ouvir algo que fosse bom. "Eu escutei e ouvi, escutei; fiquei quieto e estive atento a eles." E quão amigável se mostra Deus, quando é representado como que voltando-se para o lado, e por dizê-lo assim, exclamando com dor em Seu coração: "Em verdade escutei e em verdade ouvi; não falam o que é reto; ninguém há que se arrependa de sua maldade, dizendo: O que eu fiz?"

Ah, querido leitor, tu nunca acolhes um desejo para Deus que não anime a esperança de Deus; jamais pronuncias uma oração dirigida ao céu que Ele não esteja atento; e ainda que muito frequentemente tu tenhas sussurrado orações que foram como a nuvem da manhã e como o orvalho da madrugada que logo se desvanecem, contudo, todas estas coisas comoveram as entranhas de Jeová; pois Ele tem escutado teu clamor e tem prestado atenção ao suspiro de tua alma, e ainda que tudo tenha se desvanecido, não passou despercebido, pois Ele lembra muito bem mesmo nesse momento.

E, oh, tu que neste dia estás buscando um Salvador, recorda que os olhos desse Salvador estão postos hoje em tua alma buscadora! Não estás buscando a alguém que não possa te ver; estás vindo ao teu Pai, e teu Pai te vê à distância. Somente uma lágrima rolou por tua face, mas teu Pai a tomou com um sinal de esperança; somente uma batida sacudiu teu coração há um instante quando se cantava o hino, mas Deus, o Amante, estava atento inclusive a isso e o considerou ao menos como um presságio de que não estás tão endurecido pelo pecado, nem descartado pelo amor e a misericórdia.

O texto é: "O que eu fiz?" Introduzirei somente com algumas palavras de persuasão afetiva, exortando a todos os presentes a que se façam essa pergunta. Em segundo lugar, lhes direi algumas palavras de ajuda, tratando de responder essa pergunta; e tendo feito isso, concluirei com umas quantas frases de solene admoestação para aqueles que tiveram uma resposta adversa.

I. Primeiro, então, alguma palavras de SINCERA PERSUASÃO, solicitando a cada um dos que estão agora presentes, e mais especialmente a cada pessoa não convertida, que se façam a pergunta e a respondam solenemente: "O que eu fiz?"

Poucas pessoas gostam de tomar a moléstia de revisar suas próprias vidas. A maioria das pessoas está tão perto da bancarrota que se envergonha de revisar sua própria contabilidade. A grande maioria da humanidade se assemelha ao néscio avestruz, que, quando é perseguido de perto pelos caçadores, enterra sua cabeça na areia e fecha seus olhos, e pensa que pelo fato de não ver seus perseguidores, então está seguro. Grande parte da humanidade, repito, se envergonha de revisar sua própria biografia; e se a consciência e a memória pudessem converter-se em co-autoras de uma história de suas vidas desde o princípio até o fim, comprariam um grande ferrolho de ferro e um cadeado e encerrariam o volume, pois não se atreveriam a lê-lo. Sabem que é um livro cheio de lamento e aflição, que não se atreveriam a ler, e permanecem ainda em suas iniquidades.

Eu tenho, portanto, uma difícil tarefa ao tratar de persuadir a cada um de vocês a que peguem o livro; sem importar que suas páginas sejam umas quantas ou muitas, ou que sejam brancas ou negras, me resultará difícil induzi-los a que leiam tudo.

Mas peço que o Espírito Santo te persuada agora a que respondas a esta pergunta: "O que eu fiz?" Pois, recorda, meu querido amigo, que esquadrinhar-te a ti mesmo não pode te causar nenhum dano. Nenhum comerciante jamais empobrece por revisar seus livros; poderia descobrir-se mais pobre do pensava, mas não é a revisão dos livros que o empobreceu; ele se prejudicou por alguma prática comercial errada que ocorreu antes.

Meu amigo, é melhor que conheças o passado enquanto tenhas tempo para restaurá-lo, e não que continues com teus olhos vendados, esperando entrar pelas portas do Paraíso e descobrir teu erro quando, ai, já seja demasiado tarde porque a porta está fechada. Não se perde nada fazendo um inventário; não podes piorar em nada por causa de um breve auto-exame. Isto, em si mesmo, será um forte argumento para te induzir a fazê-lo; mas recorda que podes estar muitíssimo melhor, pois, considere que teus assuntos estejam bem com Deus: então podes estar muito feliz e consolar-te, pois aquele que está bem com seu Deus não tem motivo para estar triste.

Mas, ah, relembre que existem muitas probabilidades de que estejas mal. Há tantas pessoas neste mundo que vivem enganadas, que existem altas probabilidades de que estejas também enganado. Poderias ter um nome para a vida e ainda assim estar morto; poderias ser como a árvore de John Bunyan, do qual disse: "era formosa para ver-se e era verde por fora, mas seu interior estava suficientemente podre para ser combustível na fogueira do diabo." Neste dia poderias estar muito bem caiado diante de ti e diante de teus semelhantes, e ser sumamente bonito, mas também poderias ser este fariseu de quem Cristo disse: "...sois semelhantes aos sepulcros caiados, que por fora realmente parecem formosos, mas interiormente estão cheios de ossos de mortos e de toda a imundícia."

Agora, homem, ainda que tu queiras ser enganado, de minha parte sinto que preferiria mil vezes conhecer realmente meu próprio estado, em vez de ter as imagens mais agradáveis sobre esse estado e descobrir-me enganado.

Muitas vezes sussurrei solenemente esta oração: "Senhor, me ajude a conhecer o pior de mim; se ainda sou um apóstata de Ti, sem Deus e sem Cristo, ao menos faz com que eu seja honesto comigo mesmo e saiba o que eu sou."

Recorda, meu amigo, que o momento disponível para que faças um auto-exame é, depois de tudo, muito breve. Logo saberás o grande segredo. Talvez eu não pronuncie palavras suficientemente fortes para romper a máscara que agora tens sobre ti, mas há alguém que se chama Morte que não aceitará nenhuma lisonja. Poderias disfarçar-te hoje com as vestes de um santo, mas a morte logo te desnudará, e estarás diante do tribunal depois que a morte haja descoberto toda tua nudez, seja esta nudez inocência ou culpa.

Recorda, também, que ainda que tu possas enganar a ti mesmo, não enganarás ao teu Deus. Tu poderias sentir pequenas cargas, e o fiel da balança na qual és pesado poderia não ser honesto, e poderia, portanto, não te dizer a verdade; mas quando Deus te julgue não fará concessões; quando o eterno Jeová tome a balança da justiça e ponha Sua lei em um dos pratos, ah, pecador, como tremerás quando te ponha a ti no outro! Pois, a menos que Cristo seja teu Cristo, te encontrarás leve de peso: pesado serás na balança e serás encontrado em falta.

Oh, que palavras adotarei para induzir a cada um de vocês a que se examinem agora! Conheço as várias desculpas que alguns de vocês apresentarão. Alguns argumentarão que são membros de igrejas, e que, por tanto, não têm problemas.

Talvez estejas me olhando de alguma das galerias, e me digas: "Sr. Spurgeon, suas mãos me batizaram neste mesmo ano no Senhor Jesus, e periodicamente me passou o pão e o vinho sacramentais." Ah, meu amigo, eu sei isso, e temo que batizei a muitos, aos quais o Senhor não batizou jamais; e alguns de vocês que foram sido recebidos na membresia da igreja na terra, jamais foram recebidos por Deus. Se Jesus Cristo tinha um hipócrita entre Seus doze discípulos, quantos hipócritas não terei aqui, entre cerca de mil e duzentas pessoas?

Ah, queridos leitores, nesta época é muito fácil fazer uma profissão de religião: muitas igrejas recebem candidatos à membresia sem nenhum exame de nenhum tipo; algumas dessas pessoas vieram a mim, e eu lhes disse: "devo tratar-te da mesma maneira como se houvesses vindo do mundo", porque me disseram: "eu nunca vi ao pastor; eu escrevi uma nota à igreja, e eles me receberam."

Na verdade, nesta época de profissões de fé, um homem poderia fazer a profissão mais elevada do mundo, e sem dúvida, ser contado com os apóstatas condenados no final. Não se desviem da pergunta por essa causa; e não digam: "estou demasiado ocupado para atender meus assuntos espirituais; todavia haja tempo suficiente." Muitos disseram isso, e antes de que seu "tempo suficiente" houvesse chegado, se encontraram onde o tempo não mais existe.

Oh, tu que dizes que tens tempo suficiente, quão pouco sabes a proximidade de ti com a morte! Há algumas pessoas aqui presentes que não verão o dia de ano novo; há toda probabilidade de que um grande número de pessoas não verá outro ano. Oh, que o Senhor nosso Deus nos prepare a cada um de nós para a morte e para o juízo, e abençoe a exortação desta manhã para nossa preparação, conduzindo-nos a fazermos a pergunta: "O que eu fiz?"

II. Então, agora hei de ajudá-los a responder a pergunta: "O que eu fiz?"

Cristão, cristão verdadeiro, tenho muito pouco que dizer-te esta manhã. Não vou multiplicar minhas palavras, apenas deixarei a indagação à tua própria consciência. Que fizeste tu? Ouço que respondes: "não fiz nada para salvar-me a mim mesmo; pois isso foi feito para mim no pacto eterno, desde antes da fundação do mundo. Não fiz nada para fazer justiça para mim, pois Cristo disse: "Consumado está"; eu não fiz nada para alcançar o céu por meus méritos, pois tudo isso Jesus fez por mim antes de que eu nascesse."

Mas diga-me irmão, que fizeste tu por Ele, que morreu para salvar tua alma desventurada? Que fizeste pela Sua igreja? Que fizeste para a salvação do mundo? Que fizeste para promover teu próprio crescimento espiritual na graça?

Ah!, minha pergunta poderia arremeter duramente contra alguns de vocês que são verdadeiros cristãos; mas os deixarei com seu Deus. Deus disciplinará Seus próprios filhos. Contudo, farei uma pergunta direta. Acaso não há muitos cristãos aqui presentes, que não podem recordar terem sido o instrumento de salvação de uma única alma durante este ano? Vamos, revisa agora: tens alguma razão para crer que direta ou indiretamente foste feito o instrumento da salvação de uma alma neste ano?

Vou mais adiante. Alguns de vocês são cristãos veteranos, e lhes farei esta pergunta: têm alguma razão para crer que desde que foram convertidos foram alguma vez o instrumento de salvação de uma alma? No oriente, na época dos patriarcas, se considerava uma afronta que uma mulher não tivesse filhos; mas para um cristão quão grande afronta é que não tenha filhos espirituais, que ninguém tenha nascido para Deus por sua instrumentalidade!

E, contudo, aqui há algumas pessoas que são espiritualmente estéreis, e não trouxeram nenhum convertido a Cristo; não tem nem uma só estrela em sua coroa de glória, e devem levar ao céu uma coroa sem estrelas.

Oh! Parece-me ver o gozo e a alegria com que uma boa filha de Deus me olhou na semana passada, quando escutamos de um que havia sido convertido por sua instrumentalidade. A tomei pela mão e lhe disse: "bem, agora tens um motivo para dar graças a Deus." "Sim, senhor" -respondeu- "agora me sinto como uma mulher feliz e enaltecida. Nunca havia sido até agora, que eu saiba, o meio de trazer uma alma a Cristo." E a boa mulher se via muito feliz, e lágrimas de alegria brotavam de seus olhos.

Quantas pessoas trouxeste a Cristo durante este ano? Vamos, cristão, que fizeste? Ai! Ai! Tu não foste uma figueira estéril, mas ainda assim teu fruto é de tal natureza que não pode ser visto. Poderiam estar vivos para Deus, mas, quantos de vocês foram muito improdutivos e infrutíferos?

E não pensem que enquanto trato duramente com vocês eu mesmo queira escapar-me. Não; eu me faço a pergunta: "O que eu fiz?" E quando penso no zelo de Whitefield, e na sinceridade de muitos daqueles grandes evangelistas dos tempos antigos, fico consternado comigo mesmo, e me faço a pergunta: "O que eu fiz?" Eu somente posso responder a esta pergunta sentindo-me um pouco confuso. Quão repetidamente preguei a vocês a Palavra de Deus, e, contudo, quão poucas vezes chorei por vocês como um pastor deveria fazer! Quão frequentemente deveria adverti-los sobre a ira vindoura, e também me esqueci de ser mais esforçado do que poderia ter sido. Temo que o sangue de algumas almas permaneça em minha porta quando me apresente para ser julgado por meu Deus no final. Lhes suplico que roguem por seu pastor por isto: que seja perdoado, se alguma vez houve falta de intrepidez, e de energia e de oração, e roguem que durante o ano seguinte pregue sempre como se não pudesse pregar nunca mais:

"Como um homem moribundo a homens moribundos."

Enquanto questionava ao cristão com a pergunta: "O que eu fiz?", escutei o moralista que dizia: "senhor, fiz tudo o que deveria fazer. O senhor poderia, como um pregador do Evangelho, estar ali e falar-me sobre pecados; mas eu lhe digo, senhor, que fiz tudo o que me correspondia; sempre assisti regularmente a minha igreja ou capela cada domingo, na medida que um homem ou uma mulher podem fazê-lo; sempre fiz orações em família, e sempre oro antes de ir dormir e quando me levanto pela manhã. Não devo nada a ninguém, que eu saiba, nem fui áspero com ninguém; dou uma porção substancial aos pobres e creio que se as boas obras tem algum mérito, certamente fiz muitas."

Muito correto meu amigo, na verdade muito correto, se as boas obras tivessem algum mérito; mas desafortunadamente não tem nenhum, pois, nossas boas obras, se as fizéssemos para salvar-nos por elas, não são melhores que nossos pecados. Poderias muito bem esperar ir ao céu por amaldiçoar e jurar, que ir pelos méritos de tuas próprias boas obras; porque ainda que as boas obras sejam infinitamente preferíveis a amaldiçoar e jurar desde um ponto de vista moral, contudo, não há mais mérito em um do que há no outro, ainda que haja menos pecado em um do que no outro. Tenha a bondade de recordar, então, que tudo o que estiveste fazendo todos estes anos não serve de nada.

"Bem, senhor, mas eu confiei em Cristo." Agora, alto aí! Permita-me fazer-te uma pergunta. Queres dizer que confiaste em parte em Cristo e em parte em tuas próprias boas obras? "Sim, senhor." Bem, então, me deixe dizer que o Senhor Jesus Cristo não será utilizado para fazer contrapeso; deves tomar a Cristo plenamente, pois Cristo não será nunca a metade na obra da tua salvação. Então, repito, tudo o que tenhas podido fazer não serve de nada. Tens estado construindo uma casa de papel e a tempestade a porá por terra; tens estado construindo uma casa sobre areia, e quando as chuvas desçam, e venham rios, o último vestígio dessa casa será arrasado para sempre.

Ouçam a palavra do Senhor! "Pelas obras da lei nenhuma carne será justificada." "Maldito todo aquele que não permanecer em todas as coisas que estão escritas no livro da lei, para fazê-las"; e, na medida em que não permaneceram em todas as coisas escritas na lei, vocês são transgressores da lei, e estão debaixo de maldição, e tudo o que a lei tem para dizer-lhes, é: "maldito, maldito, maldito! Sua moralidade não lhes serve de nenhuma ajuda, com relação às coisas eternas."

Volto a outro ponto. Dizes: "bem, eu não confio em minha moralidade nem em nenhuma outra coisa; eu digo:

“Vá, torpe ansiedade, peço que se afastes de mim”

Não tenho nada que ver com falar da eternidade, como queres que faça. Mas, amigo, não sou uma pessoa má, depois de tudo. São muito poucas as coisas más que faço; de vez em quando um pecadinho, simplesmente uma pequena insensatez, mas nem meu país, nem meus amigos, nem minha própria consciência podem dizer algo contra mim. É certo, eu não sou nenhum de seus santos; eu não professo ser demasiado estrito; às vez posso ir demasiado longe, mas é somente um pouco, e me atrevo a dizer que podemos endireitar todas as coisas antes que venha o fim." Bem, amigo, mas eu gostaria que fizesses a pergunta: "O que eu fiz?"


Me parece que se cada um de vocês simplesmente tirasse essa película que cobre seu coração e sua vida, poderiam ver uma aflitiva lepra ocultando-se detrás do que fizeram. "Bem, tratando-se disso" –diria alguém- "talvez tenha bebido um copo ou dois a mais algumas vezes." Pare um pouco! Qual é o nome disso? "Vamos, é somente um pouco de alegria, amigo." Alto lá: demos o nome correto. Como chamarias se tratasse de qualquer outra pessoa? "Embriaguez, suponho."

Outro diz: "talvez tenha discursado algumas vezes sem muito refletir." Que é isso? "Foi somente um momento de dispersão. Sim, mas por favor dê o nome que corresponda: conversas lascivas. Escreve isso. "Oh, não, amigo; as coisas estão ficando muito sérias!" Sim, verdadeiramente são; mas não parecem ser mais sérias do que realmente são.

Algumas vezes saístes no domingo, não é mesmo? "Oh, sim!; mas somente de vez em quando; somente algumas vezes." Sim, mas vamos escrevê-lo como é e vejamos em que lugar da lista vai ficar. Quebrantamento do domingo! "Alto" -dizes tu- "não passei além disso, amigo; na verdade não fui muito além." Eu suponho que em tuas conversas, algumas vezes em tua vida, citaste textos da Escritura para fazer piadas, não é mesmo? E algumas vezes clamaste, quando estavas algo surpreso: "Senhor, tem misericórdia de mim!", e usaste expressões semelhantes. Não me aventuro a dizer que juras: ainda que haja uma maneira cristã de jurar que usam algumas pessoas, e consideram que não é jurar realmente, mas o que seria então, ninguém o sabe, e portanto o registraremos como juramentos: maldições e juramentos. "Oh, amigo!, foi somente quando alguém me pisou os pés, ou quando estava irado." Não importa, registra-o com seu nome correto: obteremos de ti uma boa lista em seguida.

Eu suponho que no comércio nunca adulteras teus artigos. "Bem, esse é um assunto de negócios no qual não deves interferir." Pois, acontece que vou interferir – e se estás de acordo, o chamaremos pelo seu nome correto: “roubo”. Registraremos isso. Eu suponho que nunca foste duro com um devedor, não é mesmo? Não hás desejado nunca, em nenhum momento, ser mais rico, e em outras ocasiões, não hás desejado, um pouquinho, que teu vizinho em frente perdesse parte de sua clientela, para que tu a adquirisses? Bem, chamaremos isso pelo seu nome correto: isso é "avareza, que é idolatria."

Agora, parece que a lista se está ficando negra. Além disso, como passaste todo este ano? E, ainda que tenhas pretendido orar algumas vezes, realmente oraste alguma vez? Não, não o fizeste. Bem, então deves colocar na lista: falta de oração. Algumas vezes leste a Bíblia, e algumas vezes escutaste o pastor; mas, depois de tudo, não deixaste todas estas coisas passarem ao longe? Então, eu quero saber se isso não é desprezar a Deus, e se não teríamos que registrá-l0 sob esse nome.

Na realidade somente necessitamos ir um pouco mais longe; pois a lista, uma vez somada, é pavorosa, e poucos de nós poderíamos escapar de pecados tão grandes como estes, se nossa consciência estivesse suficientemente desperta.

Mas há aqui presente um homem que se tornou muito descuidado e indiferente em relação a cada ponto de moralidade; e me diz: "Ah, jovem amigo!, eu poderia dizer-te o que fiz durante o ano." Alto, amigo, não desejo saber isso particularmente agora; podes dizer-te a ti mesmo quando chegues em casa. Há pessoas jovens aqui: talvez não lhes fizessem muito bem saber o que tu fizeste. Não és nada melhor do que deverias ser, afirmam algumas pessoas; o que significa que és tão mau que não lhes seria bom dizer o que és. Por acaso supões que em toda esta congregação não contamos com homens pervertidos, que se entreguem ao pecado mais terrível e à lascívia mais vil?

Vamos, o anjo de Deus pareceria estar sobrevoando em nosso meio e tocando a consciência de alguns para fazê-los saber a quais iniquidades se entregaram durante o ano. Eu peço a Deus que minha simples alusão a eles possa ser o instrumento para despertar sua consciência.

Ah! Vocês poderiam ocultar seus pecados; o cobertor da escuridão poderia ser seu refúgio; vocês poderiam pensar que não serão descobertos nunca; mas recordem que cada pecado que tenham cometido será lido diante do Sol, e os homens e os anjos o escutarão no dia da conta final.

Ah, querido leitor! Independentemente que sejas moral ou que sejas dissoluto, te suplico que respondas hoje solenemente a esta pergunta: "O que eu fiz?" Seria muito bom que pegasses um pedaço de papel quando chegasses em casa, e simplesmente escrevesses tudo o que fizeste, desde Janeiro passado até Dezembro; e se alguns de vocês não se espantam com isso, devo dizer-lhes que devem ter nervos muito fortes, e que ainda não são candidatos ao pânico.

Agora me dirijo de maneira especial ao homem não convertido, e gostaria de ajudá-lo a responder a esta pergunta desde outro ponto de vista. "O que eu fiz?" Ah, homem, tu que vives em pecado, tu que és um amante do prazer mais que um amante de Deus, que fizeste tu? Acaso não sabes que um pecado basta para condenar uma alma para sempre? Acaso não leste nunca na Santa Escritura que é maldito o que peca uma só vez? Quão condenado, então, tu estás pelas miríades de pecados somente deste ano! Recorda, te suplico, os pecados de tua juventude, e tuas transgressões anteriores até este momento; e se somente um pecado te arruinaria para sempre, quão arruinado estás agora! Vamos, homem, uma onda de pecado poderia afogar-te. Que farão estes oceanos de tua culpa? Uma única testemunha contra ti bastará para condenar-te: contempla as multidões de absurdos e de crimes congregados ao redor do tribunal que vieram testemunhar contra ti no juízo. Como escaparás de seus testemunhos, quando Deus te chame ao Seu tribunal? Que fizeste tu? Vamos, homem, responde esta pergunta. Há muitas consequências envolvidas em teu pecado, e para responder esta pergunta corretamente deves responder a cada consequência: que fizeste à tua própria alma? Vamos, tu a destruíste; fizeste o melhor que podias para arruiná-la para sempre. Tens estado cavando calabouços para tua própria pobre alma; tens estado empilhando feixes de lenha; tens estado forjando correntes de ferro, combustível para queimá-la, e grilhões para acorrentá-la para sempre.

Recorda, teus pecados são como o plantio para uma colheita. Que colheita semeaste para tua pobre alma! Semeaste vento e colherás torvelinho; iniquidade semeaste e condenação colherás.

Mas que fizeste contra o Evangelho? Recorda quantas vezes este ano escutaste sua pregação. Vamos, desde teu nascimento tem havido vagões carregados de sermões desperdiçados em ti. Teus pais oraram por ti em tua juventude; teus amigos te instruíram até que alcançaste a idade adulta. Desde então, quantas lágrimas foram derramadas pelo pastor por tua causa! Quantas súplicas foram dirigidas aos teus ouvidos! Mas tu quebraste a flecha. Os pastores se preocuparam em salvar-te, mas tu não te preocupaste por ti mesmo.

Que fizeste contra Cristo? Recorda que Cristo foi um bom Cristo para os pecadores aqui; mas assim como não há nada que arda tão bem como essa suave substância que é o azeite, assim não haverá nada que seja tão feroz como esse Salvador de bondoso coração, quando venha para ser teu Juiz. Mais feroz que um leão sobre sua presa é o amor rejeitado. Despreza a Cristo na cruz, e será algo terrível para ti ser julgado por Cristo quando estejas em Seu trono.

Além disso: que fizeste por teus filhos neste ano? Oh! Há alguns aqui presentes que tem estado fazendo todo o possível para arruinar as almas de seus filhos. "É uma responsabilidade a que descansa sobre um pai"; e, que se dirá de um pai bêbado? Que se dirá do homem que dá a seus filhos um exemplo de embriaguez?

Blasfemo, que fizeste por tua família? Acaso não tens estado retorcendo a corda para sua destruição eterna? Acaso não farão com segurança o mesmo que tu fazes?

Mãe, tu tens vários filhos, mas neste ano não oraste por nenhum deles. Nunca puseste teu braço ao redor deles enquanto estavam de joelhos junto à sua cama pela noite, e diziam: "Pai nosso"; nunca lhes falaste do Jesus que amava as crianças, e que uma vez se fez uma criança como eles. Ah, então, descuidaste de teus filhos.

Eu recordo uma mãe que foi convertida a Deus em sua velhice e ela me disse – e não esquecerei nunca a dor dessa mulher- "Deus me perdoou, mas eu nunca me perdoarei a mim mesma. Pois, senhor," - comentou ela - "alimentei e criei meus filhos, mas o fiz sem nenhuma consideração à religião." E logo começou a chorar e me disse: "senhor, fui uma mãe cruel; fui uma infeliz!" "Vamos, minha boa mulher" - lhe repliquei- "tu criaste teus filhos." "Sim," –respondeu ela- "meu esposo morreu quando eram muito pequenos e me deixou com seis filhos e estas mãos ganharam o pão para eles e lhes proveram as vestes; "ninguém" -me disse- "poderia acusar-me de ser áspera com eles em algo, exceto nisto: mas resulta ser o pior de tudo, pois fui uma mãe cruel para eles, pois enquanto alimentava seus corpos, descuidava de suas almas."

Mas alguns têm ultrapassado isto. Ah, jovem amigo, não somente fizeste o melhor que podias para condenar-te, mas tu fizeste o melhor para condenar a outros! Recorda em Janeiro passado, quando convidaste aquele jovem para que fosse pela primeira vez ao bar, e riste de todos seus infantis escrúpulos segundo os chamavas tu, e lhe convidaste a que bebesse como fizeste tu. Recorda quando na escuridão da noite conduziste ao mau caminho por primeira vez a um jovem cujos princípios eram virtuosos, e que não conhecia a lascívia até que tu a revelaste; lhe disseste naquele momento: "vem comigo; te mostrarei a vida de Londres, vou deixar que vejas o prazer!" Aquele homem jovem -quando veio à tua oficina pela primeira vez- costumava ir à casa de Deus aos domingos e parecia dar indícios de ir ao céu, "ah!", -dizes- "pelo ridículo tirei do Jackson a religião, e já não vai a nenhum lado aos domingos exceto para ir para a farra, e é tão divertido agora como qualquer um de nós." Ah!, amigo, e tu terás dois infernos quando te converteres em um condenado; terás teu próprio inferno e o seu também, pois ele te olhará através das arrepiantes chamas, e te dirá: "talvez nunca tivesse estado aqui, se tu não me houvesses trazido aqui!" E, ah!, sedutor, que olhos serão os que te olharão com um olhar feroz e penetrante através do horror do inferno? Serão os olhos de alguém a quem conduziste à iniquidade! Que duplo inferno será para ti quando te olhem ferozmente como duas estrelas cuja luz é fúria murchem teu sangue para sempre!

Façam uma pausa, vocês que conduziram outros ao desvio, e tremam agora. Eu mesmo fiz uma pausa, e orei a Deus quando conheci o Salvador, para que me ajudasse a conduzir a Cristo àqueles que eu havia conduzido ao desvio de alguma maneira.

E eu recordo que George Whitefield diz que quando começou a orar, sua primeira oração foi que Deus convertesse aqueles com os quais costumava jogar cartas desperdiçando seus domingos. "E bendito seja Deus" -diz- "cada um deles foi convertido".

Oh, Deus meu, acaso não posso detectar surpresa e terror em algum rosto aqui? Acaso não tremem e batem seus joelhos? Acaso não se acovarda em seu interior o coração de ninguém por causa de sua iniquidade? Na verdade não pode ser assim, pois de outra maneira seus corações se transformariam em aço, e suas entranhas se transformariam como ferro em seu interior. Na verdade, se fosse assim, as palavras de Deus são com certeza verdadeiras, aquelas palavras nas quais diz, no versículo sete deste capítulo: "Até a cegonha no céu conhece os seus tempos determinados, e a rola e o grou e andorinha observam o tempo da sua arribação; mas o meu povo não conhece o juízo do Senhor." E certamente tinha razão aquele profeta que disse: "O boi conhece o seu possuidor, e o jumento a manjedoura do seu dono; mas Israel não tem conhecimento, o meu povo não entende."

Oh, são vocês tão brutos para deixar que as reflexões dessa culpa passem sobre vocês sem que lhes causem espanto e terror? Então, na verdade, nós que sentimos nossa culpa temos necessidade de dobrar nossos joelhos por vocês, e orar para que Deus os conduza todavia a conhecerem-se a vocês mesmos; pois, vivendo e morrendo como vocês são, endurecidos e sem esperança, sua porção deverá ser extremamente horrível.

Quão feliz seria se pudesse esperar que a maioria de vocês pudesse acompanhar-me nesta humilde confissão de nossa fé; posso falar como se estivesse falando por cada um de vocês? Será opção de vocês aceitar o que disse ou rejeitá-lo; mas eu confio que a grande maioria de vocês me seguirá: "Oh, Senhor! Eu confesso nesta manhã que meus pecados são mais pesados do que posso suportar; mereci Tua ira mais ardente, e Teu infinito desgosto; e dificilmente me atreveria a esperar que possas ter misericórdia de mim; mas, considerando que Tu entregaste a Teu Filho para que morresse na cruz pelos pecadores, e que Tu disseste também: 'Olhai para mim, e serei salvos, vós, todos os termos da terra,' Senhor, eu te olho nesta manhã, e ainda que nunca tenha olhado antes, contudo, olho agora; ainda que tenha sido um escravo do pecado até este momento, contudo, Senhor, aceita-me, pecador como sou, por meio do sangue e da justiça de Teu Filho, Jesus Cristo. Oh Pai, não me olhes com desagrado; sei que poderias fazê-lo, mas eu invoco essa promessa que diz: 'e o que vem a mim, de maneira nenhuma o lançarei fora.' Senhor, eu venho:

'Tal como sou, sem nenhum argumento,
Exceto que Teu sangue foi derramado por mim,
E que Tu me pediste que viesse;
Oh Cordeiro de Deus, eu venho.'

'Minha fé, na verdade, põe sua mão
Nessa Tua amada cabeça,
Enquanto que como penitente estou,
E ali confesso meu pecado.'

Senhor, me aceita, Senhor me perdoe, e me tome como sou, de agora em diante e para sempre, para que seja Teu servo, para que seja Teu redimido quando morra."

Podes dizer isso? Acaso não o disseram muitos corações? Acaso não ouvi que muitos lábios o sussurraram em silêncio? Tem bom ânimo, meu irmão, minha irmã; se isso brotou de teu coração, estás tão a salvo como os anjos do céu, pois és um filho de Deus, e não perecerás nunca.

III. Agora tenho que dirigir umas quantas palavras de ADMOESTAÇÃO AFETUOSA, e então terei concluído. É algo muito solene pensar como os anos voam. Nunca passei um ano mais curto em minha vida que este, e quanto mais velho fico, mais breves se tornam os anos; e tu, ancião, me atreveria a dizer: olhas atrás para teus sessenta ou setenta anos, e dizes: "Ah, jovem amigo, parecerão mais curtos muito em breve." Sem dúvida o serão. "Ensina-nos a contar os nossos dias, de tal maneira que alcancemos corações sábios."

Mas, não é acaso algo solene que outro ano quase haja passado, e, contudo, muitos de vocês não sejam salvos? Vocês se encontram exatamente onde se encontravam no ano passado. Não, não se encontram no mesmo lugar, pois estão mais perto da morte, e estão mais perto do inferno, a menos que se arrependam; e, talvez, nem sequer o que eu disse esta manhã surtirá algum efeito em vocês. Não estão endurecidos completamente, pois tiveram muitas impressões sérias. Quantidade de vezes choraram pelos sermões, mas, tudo foi em vão, pois seguem sendo o que eram.

Lhes suplico que respondam a esta pergunta: "O que eu fiz?", pois recordem que virá o tempo em que farão essa pergunta, mas será demasiado tarde. Quando será isso? -Perguntas- No leito da morte? Não, ali ainda não é demasiado tarde.

"Enquanto a lâmpada siga ardendo,
O pecador mais vil poderia regressar."

Mas será demasiado tarde para perguntar: "O que eu fiz?", quando a respiração houver abandonado teu corpo. Simplesmente suponham que o Monumento[2] fosse como costumava ser, antes de que impedissem o acesso. Suponham que sobes pelas escadas de caracol até em cima, com plena determinação de destruir-se. Encontra-se na parte exterior da grade da varanda. Podem imaginá-lo por um momento perguntando: "O que eu fiz", justo depois de haver saltado? Vamos, me parece que algum espírito no ar poderia sussurrar: "fiz? Fizeste o que não podes desfazer nunca. Estás perdido, perdido, perdido!".

Agora, recordem que os que não tem a Cristo estão subindo hoje por essa escada de caracol; talvez amanhã estarão na hora da morte, no cume dessa torre, e quando a morte se houver apoderado de vocês, e estiverem no momento preciso de saltar desse monumento para baixo, no momento de desespero, essa pergunta estará cheia de horror para vocês: "O que eu fiz?"

Mas a resposta para ela não será de utilidade, mas sim cheia de terror. Parece-me ver um espírito lançado ao mar da eternidade. Ouço que pergunta: "O que eu fiz?" És submerso em meio às ondas de fogo, e grita: "O que eu fiz?" Vês diante de ti uma longa eternidade; mas fazes a pergunta novamente: "O que eu fiz?" A terrível resposta chega: "tu ganhaste tudo isto. Tu conhecias teu dever, mas não o cumpriste; foste advertido, mas desdenhaste a advertência."

Ah! Ouçam o funebre monólogo de tal espírito. O último e grandioso dia chegou; o trono chamejante está instalado, e o grande livro é aberto. Ouço quando folheiam as folhas com ruídos terríveis. Vejo que se fazem sinais aos homens para que se formem à direita ou à esquerda, de acordo ao resultado desse grande livro. E ‘o que eu fiz?’ Eu sei que para mim o pecado será destruição, pois nunca busquei a um Salvador. Que acontece agora? O Juiz fixou Seu olhar em mim. Agora se voltou para mim. Me dirá: "Apartai-vos de mim, maldito"? Oh, que seja eu esmagado para sempre em vez de suportar esse olhar. Não há nenhum ruído, mas o dedo é levantado, e sou arrastado para fora da multidão, e estou sozinho diante do Juiz. Ele vira minha página, e antes de que a leia, meu coração treme dentro de mim. "Assim seja" –diz Ele- "não foi apagado com meu sangue. Tu desprezaste meus chamados; riu do meu povo; não quiseste nada de minha misericórdia; disseste que receberias o pagamento da tua injustiça. Receberás teu pagamento, e o salário do pecado é a morte." Ah, miserável de mim, e, está a ponto de dizer: "Apartai-vos de mim, maldito"? Sim, com uma voz mais forte que mil trovões, diz: "Apartai-vos de mim, maldito, para o fogo eterno preparado para o diabo e seus anjos”. “Ah, tudo está certo agora. Eu ria do pastor porque pregava sobre o inferno; e aqui estou, eu mesmo, no inferno; ah!, eu costumava me perguntar por que ele queria assustar-nos tanto. Ah!, quisera Deus me haver aterrorizado mais, e que eu houvesse ficado tão assustado como para sair deste lugar. Mas agora, eis-me aqui perdido e sem escapatória. Estou em trevas tão escuras que não há um raio de luz que possa alcançar-me jamais. Estou encerrado tão hermeticamente, que nenhum dos ferrolhos nem barras podem ser tiradas jamais. Estou condenado para sempre.”

Ah, esse é um terrível monólogo. Eu não posso dizer a vocês. Oh, se vocês mesmos pudessem estar ali, se somente pudessem conhecer o que sentem os condenados, e ver o que tem que aguentar, então se surpreenderiam que eu não haja sido mais intrépido na pregação do Evangelho, e se maravilhariam, não porque eu deseje fazê-los chorar, mas porque não haja chorado muito mais eu mesmo, e não haja pregado mais solenemente.

Ah, meus leitores, como vive o Senhor meu Deus, em cuja presença estou, algum dia serei reconhecido por sua consciência como havendo sido um verdadeiro testemunho para vocês esta manhã; mas não há nenhum de vocês aqui hoje que fique sem desculpa se perecer. Vocês foram advertidos; eu lhes adverti tão sinceramente como pude. Não tenho mais poderes para usar, não mais artes para tentar, não mais persuasão que possa utilizar.

Unicamente posso concluir dizendo que lhes suplico que corram para Jesus. Suplico-lhes, como espíritos imortais que estão destinados a uma bem-aventurança eterna ou a uma pena eterna, que fujam para Cristo; busquem misericórdia de Suas mãos; confiem Nele e sejam salvos; e por sua conta e risco, rejeitem minha solene advertência. Recordem que podem rejeitá-la, mas não estão rejeitando a mim, mas a Ele, que me enviou. Poderiam desprezá-la, mas não estão desprezando a mim, mas a um maior que Moisés, a Jesus Cristo o Senhor; e quando se apresentem diante de Seu tribunal, Sua linguajem será contundente, e Suas palavras terríveis, quando os condene para sempre, para SEMPRE, PARA SEMPRE, sem esperança, para sempre, para sempre, para sempre. Que o Senhor nos livre disso, por Jesus Cristo nosso Senhor, Amém!

___________________
ORE PARA QUE O ESPIRITO SANTO USE ESSE SERMÃO PARA CONVERSÃO DE MUITAS ALMAS PARA CRISTO.

Tradução: Rosangela Cruz
Revisão e diagramção: Armando Marcos
Texto original: "¿Qué He Hecho?", de Allan Román,
Traduzido do original em inglês “WHAT HAVE I DONE?”, do Volume 4 do New Park Street Pulpit.

NOTAS

[1] Nesse sermão, preferi traduzir o versículo bíblico de Jeremias 8:6 da forma direra da KingJames Version para que a fluência fosse melhor do que “que fiz eu”, como aparece na ACF (Nota do tradutor)
[2] Spurgeon faz referência a uma coluna dórica conhecida em inglês como “The Monument”,  foi construída perto da Ponte de Londres em 1677 para lembrar o grande incêndio que devastou a cidade de Londres em 1666. Para subir ao mirante, protegido com uma grade para os turistas, de onde se pode contemplar toda a cidade, há 311 degraus. Provavelmente estava em reforma no momento do comentário de Spurgeon, e não havia acesso ao público . (Nota do tradutor Allan Román) A capa desse sermão é uma lustração de 1905 do Monumento

domingo, 25 de dezembro de 2011

O Milagre do Nascimento de Cristo



Devocional de Hernandes Dias Lopes “...e o Seu nome será: Maravilhoso Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz.” Isaías 9:6.

O Natal nos fala do nascimento de Jesus, o Filho do Altíssimo. Ele deixou a glória excelsa e desceu até nós. Esvaziou-Se e assumiu a forma humana. Jesus sendo Deus Se fez homem, sendo Rei Se fez servo, sendo exaltado, humilhou-Se até à morte e morte de Cruz. O nascimento de Jesus foi prometido desde a eternidade. As profecias apontaram para a Sua vinda. DEle falaram os patriarcas e os profetas. Todos os sacrifícios judaicos eram sombras que apontavam para a Sua realidade. Na plenitude dos tempos, Ele nasceu em Belém, nasceu de mulher, nasceu sob a Lei para ser o nosso Redentor.

Seu nascimento foi um milagre, Sua vida foi um portento, Sua morte foi substitutiva, Sua ressurreição foi poderosa. O Natal não é uma festa pagã. A figura central do Natal não é o Papai Noel, nem a mensagem central do Natal é o comércio. Natal não é o brilho pálido da Terra, mas a luz fulgurante do Céu. Natal não é troca de presentes nem banquetes requintados, mas a oferta da Graça, o presente da salvação. Jesus Cristo é o milagre do Natal, o conteúdo do Natal, a razão da nossa celebração.

Oremos
Senhor, neste dia, assumo o compromisso de celebrar o Natal pelos motivos certos. Vou comemorar o nascimento de Jesus, o Salvador do mundo, como o meu redentor pessoal. Em Cristo. Amém.

FONTE Devocional "Cada Dia" de Dezembro, retirado de http://somentedeusgloria.blogspot.com/2011/12/milagre-do-nascimento-de-jesus.html

sábado, 24 de dezembro de 2011

Sermões Natalinos de C.H.Spurgeon, Acesse, seja abençoado

por Armando Marcos


Desde que começamos o Projeto Spurgeon, já traduzimos 5 sermões de C.H.Spurgeon, de vários aspectos referentes ao nascimento de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, de diferentes pontos de vista;  aproveite. leia, seja abençoado pelo Senhor de diversas formas, divulgue, repasse!! Clique nas imagens para acessar os sermões; Bom Natal



domingo, 18 de dezembro de 2011

Encerramento de EBD infantil e dia do Pastor na IPB-Bela Vista

Nesse domingo dia 18 tivemos o encerramento das aulas da Escola Bíblica Dominical das crianças da Igreja: o Evento ocorreu no fim das classes, e ocorreu uma pequena apresentação de versículos lidos pela classe liderados pelo diácono Romildo
diácono Romildo liderando a apresentação da Escola Bíblica Infantil


Ainda na parte de louvor de nossa liturgia, tivemos a apresentação especial de duas canções natalinas cantadas pela irmãs Iasmim, Darlene e Rafael. Depois do culto ministrado, o tivemos nosso momento de confraternização da Igreja no andar inferior da mesma, onde o rev. Elton Souza foi  presenteado e abençoado por conta do Dia do Pastor Presbiteriano comemorado todo dia 17 de dezembro.


Rev. Elton agradecendo para a Igreja por sua intercessão junto a Deus
por ele e sua família 
Louvado seja Deus e  nosso Senhor Jesus Cristo por seu Espirito Santo habitando e nós, e pelo privilégio de nos reunirmos em corpo de Cristo nesse local; que Seu nome seja Glorificado sempre

E mais um aviso: no dia 25 de Dezembro e 1º de Janeiro de 2012, os cultos ocorrerão normalmente, as 18:30, e teremos aulas das Escolas Dominicais normalmente iniciando as 17:00. Se você quiser não tiver algum local para ir nesse Natal e Ano -Novo, compareça, louve e adore o Senhor conosco. (em 1º de Janeiro, teremos a celebração da ceia do Senhor: se você é membro de uma igreja evangélica e está em comunhão com ela, mas quiser celebrar o sacramento conosco, é bem-vindo, em Cristo!)



pastor Elton e família após a oração final de agradecimento,  com a irmã
Silvia ao centro (de quem peguei as fotos, hehehe)





domingo, 11 de dezembro de 2011

O Cântico de Maria (sermão de Natal, por C.H.Spurgeon)


Nº 606
Sermão pregado na manhã de Domingo, 25 de Dezembro de 1864
por Charles Haddon Spurgeon,
no Tabernáculo Metropolitano, Newington, Londres


“Disse então Maria: A minha alma engrandece ao Senhor, e o meu espírito se alegra em Deus meu Salvador” - Lucas 1:46-47

Maria estava de visita quando expressou sua felicidade na linguagem desse nobre cântico. Seria bom que todas nossas relações sociais fossem tão úteis para nossos corações, como essa visita foi para Maria. “Ferro com ferro se afia; e assim o homem afia o rosto de seu amigo”. Maria, cheia de fé, faz uma visita a Isabel, quem estava ensopada de uma santa confiança, e no pouco tempo de estarem reunidas, sua fé remonta-se a plena convicção e sua plena convicção brotava em uma torrente de sagrado louvor. Esse louvor despertou seus poderes adormecidos, e em lugar de aldeãs comuns, vemos diante de nós duas profetizas e a duas poetizas, sobre as quais o Espírito de Deus descansou em abundância.

Quando nos reunimos com nossos parentes e conhecidos, nossa oração a Deus deve implorar que nossa comunhão seja, não somente agradável, mas sim proveitosa, que não se trate simplesmente de passar o tempo e de desfrutar de uma hora agradável, mas sim que possamos nos aproximar ao céu na marcha de um dia, e que possamos adquirir uma maior aptidão para nosso eterno repouso.

Observem, essa manhã, o gozo sagrado de Maria, para que possam imitá-lo. Essa é uma época na que todos esperam que sejamos felizes. Felicitamos-nos uns aos outros desejando que possamos ter um “Feliz Natal”. Alguns cristãos que são um pouco escrupulosos não gostam da palavra “feliz”. É uma boníssima palavra proveniente do antigo saxão, que contém a felicidade da meninice e o júbilo da idade adulta, que traz a nossa mente o antigo canto dos coros natalinos e o repique dos sinos da meia-noite, o azevinho e as lareiras ardendo. Eu amo essa palavra por sua menção em uma das mais ternas parábolas que descreve que, quando o filho pródigo, perdido por tão longo tempo, regressou para casa de seu pai são e salvo, “começaram a se alegrar”. Essa é a época se espera que sejamos felizes, e o desejo de meu coração é que, no mais sublime e melhor sentido, vocês, crentes, sejam “felizes”.

O coração de Maria estava alvoroçado dentro dela – porem, aqui está o sinal de seu alvoroço: que se tratava de uma alegria santa e cada uma de suas gotas era de um reboliço sagrado. Não era um alvoroço com o quão os mundanos desfrutam de suas farras hoje e amanhã, mas sim um júbilo como o que os anjos desfrutaram ao redor do trono onde cantam: “Glória a Deus nas alturas”, enquanto nós cantamos: “E na terra paz, boa vontade para com os homens”. Tais corações ditosos gozam de um festival continuou. Eu quero que vocês, ‘os que estão nas bodas’, possuam hoje e amanhã, sim, possuam em todos seus dias a sublime e consagrada bem-aventurança de Maria, para que não somente possam ler suas palavras, mas que as usem em vocês mesmos, experimentando sempre seu significado: “Engrandece minha alma ao Senhor; meu espírito se alegra em Deus meu Salvador”.

Em primeiro lugar, observem que ela canta – em segundo lugar, ela canta docemente – em terceiro lugar, pergunto, haverá de cantar sozinha?

I. Observem primeiro que MARIA CANTA.

Seu tema é um Salvador; ela aclama ao Deus encarnado. O longamente esperado Messias está a ponto de aparecer. Aquele a quem os profetas e os príncipes esperaram durante longo tempo, está a ponto de vir e de nascer da virgem de Nazaré. Em verdade jamais houve um tema para o mais doce cântico que esse: a condescendência da Deidade para com a fraqueza da humanidade. Quando Deus manifestou Seu poder nas obras de Suas mãos, as estrelas matutinas cantaram em coro e os filhos de Deus deram gritos de júbilo – porem quando Deus se manifesta Ele mesmo, que música bastaria para o grandioso salmo de assombro adorador?  Quando a sabedoria e o poder são vistos, não são vistos senão os atributos – porem na encarnação, é a pessoa divina quem é revelada no véu de nossa inferior argila: Maria bem poderia cantar, já que a terra e o céu mesmo agora se maravilham diante da graça condescendente. Digna de uma música sem comparação é a notícia de que “o Verbo foi feito carne, e habitou entre nós.” Já não existe mais um grande abismo estendido entre Deus e Seu povo, pois a humanidade de Cristo construiu uma ponte sobre ele. Já não pensamos mais que Deus assenta-se no alto, indiferente as necessidades e aflições dos homens, pois Deus nos visitou e desceu até a baixeza de nossa condição. Não necessitamos nos lamentar mais porque não possamos jamais participar da glória moral e da pureza de Deus, pois se Deus em glória desce até Sua criatura pecaminosa, é certamente mesmo difícil levar essa criatura – lavada com o sangue e purificada – às alturas por essa via adornada de estrelas, para que o redimido se sente para sempre em Seu trono.

Não devemos sonhar mais, sumidos em sombria tristeza, que não podemos nos aproximar a Deus, e quer Ele não ouvirá realmente nossa oração, nem se compadecerá de nossas necessidades, se vemos que Jesus se converteu em osso de nossos ossos e carne de nossa carne: um bebê nascido igual que nós, vivendo a vida que nós temos que viver, carregando com as mesmas debilidades e aflições, e inclinando Sua cabeça diante da mesma morte.

Ó, não podemos vir com ousadia por esse caminho novo e vivo e apelar ao trono da graça celestial, quando Jesus reúne-se conosco como Emanuel, Deus conosco? Os anjos cantaram sem quase saber a razão. Podiam entender o porquê que Deus havia se feito homem? Devem ter conhecido que ai havia um mistério de condescendência – porem todas as amorosas consequências que a encarnação implicaram, nem suas agudas mentes teriam podido adivinhar; porem, nós vemos tudo, e compreendemos mais plenamente o grandioso desígnio. A manjedoura em Belém era grande em glória – na encarnação estava envolvida toda a bem-aventurança mediante a qual uma alma, arrebatada das profundezas do pecado, é alçada às alturas da glória. Nosso maior conhecimento não nos conduzirá a alturas de canto que as conjecturas angelicais não podiam alcançar? Por acaso os lábios dos querubins serão movidos a dizer sonetos ardentes e nós, que somos redimidos pelo sangue do Deus encarnado, vamos ficar traiçoeira e ingratamente calados?

Não cantaram os arcanjos Tua vinda?
Não aprenderam os pastores Sua direção?
A vergonha me cobriria por ingrato,
Se minha língua se recusasse a louvar”

Esse, no entanto, não foi o tema completo de seu santo hino. Seu peculiar deleite não era que um Salvador devia nascer, mas sim que devia nascer para ela. Ela era bendita entre as mulheres e altamente favorecida do Senhor – porem, nós podemos desfrutar do mesmo favor – e mais, nós devemos desfrutar dele ou a vinda do Salvador não nos serviria de nada para nós. Eu sei que Cristo no Calvário tira o pecado de Seu povo. Porem, ninguém conheceu jamais o poder de Cristo na cruz, a menos que o Senhor seja formado no indivíduo como a esperança de glória.

A ênfase do cântico da virgem está colocada sobre a graça especial de Deus para com ela. Essas breves palavras, esses pronomes pessoais, nos informam que se tratava realmente de um assunto pessoal com ela. “Engrandece MINHA alma ao Senhor, e MEU espírito se alegra em Deus MEU Salvador”. O Salvador era, de forma peculiar e em um sentido especial, seu. Ao cantar, ela não disse: “Cristo para todos”, mas sim que seu alegre tema foi: “Cristo para mim”.

Amados, Cristo Jesus está em seu coração? Uma vez o olharam desde um ponto distante, e esse olhar os curou de todas suas enfermidades espirituais, porem, agora vivem descansando Nele, e o recebem em suas próprias entranhas como seu alimento e bebida espirituais? Vocês frequentemente se alimentaram de Sua carne e beberam de Seu sangue em santa comunhão – foram sepultados juntamente com Ele para morte pelo batismo – vocês se entregaram em sacrifício a Ele e o tomaram como sacrifício para vocês; podem cantar sobre Dele como a esposa o fez: “Sua esquerda está debaixo de minha cabeça, e sua direita me abraça... Meu amado é meu, e eu sou sua – Ele apascenta entre os lírios.

Esse é um feliz estilo de vida, e todo o que não chegue a isso é um pobre trabalho de escravos. Ó, vocês não podem conhecer o gozo de Maria a menos que Cristo se converta em seu, real e verdadeiramente – porem, á, quando Ele é seu, seu interiormente e reina em seu coração, e controla todas suas paixões, e transforma sua natureza, e subjuga suas corrupções inspirando-lhes santas emoções, seu no íntimo, sendo uma alegria indizível e cheia de glória – ó, então podem cantar, devem cantar, quem poderia calar suas línguas? Ainda que todos os burladores e os escarnecedores de terra lhes pedissem que se calassem, vocês teriam que cantar, pois seus espíritos devem se regojizar em Deus seu Salvador.

Perderíamos muita instrução se passássemos por alto o fato de que o poema escolhido que temos diante de nós é um hino de fé. O Salvador ainda não havia nascido, e tampouco, até onde podemos julgar, tampouco a virgem tinha alguma evidência do tipo requerido pelo sentido carnal para fazê-la crer que um Salvador nasceria dela. ‘Como isso poderia ser?’, era uma pergunta que naturalmente poderia ter suspendido seu cântico enquanto não recebesse uma resposta convincente para carne e sangue – porem, não tinha surgido tal resposta. Ela sabia que para Deus todas as coisas são possíveis e um anjo lhe havia entregado essa promessa, e isso lhe bastava: pela força da Palavra que saiu de Deus, seu coração saltou de alegria e sua língua glorificou Seu nome.

Quando considero o que é o que ela creu, e como recebeu a palavra sem duvidar, estou disposto a dar-lhe como mulher, um lugar quase tão proeminente como o que Abraão ocupou como homem – e se não me atrevo de chamá-la de mãe dos fiéis, pelo menos deve receber a honra devida como uma das mais excelentes mães de Israel. Maria merecia com crédito a benção de Isabel: “Bem- aventurada a que creu”. Para ela “a certeza do que se espera foi sua fé, e fé foi também sua convicção do que não se vê” – ela sabia pela revelação de Deus, que devia levar a semente prometida que feriria a cabeça da serpente – porem, não tinha nenhuma outra prova.

Nesse dia há alguns em nosso meio que possuem pouco ou nenhum gozo consciente da presença do Salvador – caminham e trevas e não enxergam nenhuma luz – gemem pelo pecado inato e se lamentam porque as corrupções prevalecem – devem confiar agora no Senhor, e lembrar que se crêem no Filho de Deus, Cristo Jesus está neles, e por fé, muito bem podem cantar gloriosamente a aleluia do amor adorador. Ainda que o sol não brilhe hoje, as nuvens e as névoas não apagaram sua luz, ainda que o Sol da Justiça não brilhe sobre você nesse instante, mantém Seu lugar nesses céus e não conhece variabilidade nem a sombra de uma mudança. Se, apesar de todas suas escavações, o poço não brota, deve saber que uma constante plenitude permanece nessa profundeza, que se esconde por trás do coração e propósito de um Deus de amor. Se como Davi, você está abatido como ele esteve, diga à sua alma: “Espera em Deus, porque ainda hei de louvar-te, salvação minha e Deus meu”. Então, alegre-se com a alegria de Maria: o gozo de um Salvador que é completamente seu, mas que é evidenciado como tal não pelo sentido, mas sim pela fé. A fé possui sua música igual que o sentido, mas é de uma classe mais divina: se as comidas fartas nas mesas fazem com que os homens cantem e dancem, os festejos de uma natureza mais refinada e etérea enchem os crentes de uma santa plenitude de deleite.

Ainda ouvindo o cântico da virgem favorecida, permitam-me observar que sua baixeza não a fez parar seu cântico – melhor, inserta nele uma nota mais doce. “Porque há olhado para a baixeza de sua serva.” Querido amigo, você está sentindo mais intensamente que nunca a profundeza de sua natural depravação, e é abatido sob o sentido de suas muitas falhas, e está tão morto e tão ligado à terra ainda mesmo nessa casa de oração que não pode se levantar para Deus – Tem estado triste e deprimido, enquanto nossas cantatas de Natal ressoaram em seus ouvidos – se sente hoje tão inútil para a Igreja de Deus, tão insignificante, tão completamente indigno, que sua incredulidade lhe sussurra: “Em verdade, em verdade, não possui nenhum motivo para cantar”.

Vamos, meu irmão, vamos, minha irmã, imitem essa bendita virgem de Nazaré, e convertam a essa própria baixeza e insignificância que sentem tão dolorosamente, em uma razão para uma louvação incessante. Filhas de Sião, digam docemente em seus hinos de amor: “Tem olhado para baixeza de sua serva”. Entre mais indigno sou de Seus favores, mais docemente cantarei de Sua graça. O que importa que eu seja o mais insignificante de todos Seus escolhidos? – eu louvarei Àquele que com olhos de amor me buscaram, e puseram Seu amor em mim. “Eu te louvo, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeu essas coisas dos sábios e entendidos, e as revelou aos meninos. Sim, Pai, porque assim lhe agradou”.

Queridos amigos, estou seguro de que o recordo de que há um Salvador e de que esse Salvador é seu, deve fazer-lhes cantar – e se colocam junto a esse pensamento de que uma vez foram pecadores, imundos, vis, odiosos e inimigos de Deus, então suas notas se remontarão mais alto, e chegarão até o terceiro céu para ensinar o louvor de Deus às harpas de ouro.

É muito digno de ser advertir que a grandeza da benção prometida não lhe deu à doce cantante um argumento para suspender seu agradecido tom. Quando medito sobre a grande bondade de Deus ao amar a Seu povo antes que a terra existisse, ao entregar Sua vida por nós, ao interceder por nossa causa diante do trono eterno, ao dispor um paraíso de repouso para nós para sempre, um negro pensamento me perturbou: “Certamente esse é um privilégio demasiadamente sublime para um inseto de um dia como é essa pobre criatura, o homem”. Maria não contemplou esse assunto incredulamente, mas sim que se alegrou mais intensamente por isso mesmo. “Porque grandes coisas o Poderoso me há feito”.

Vamos, alma, é grandioso ser um filho de Deus, porem, como seu Deus faz grandes portentos, não vacile motivado pela incredulidade, mas sim triunfe em sua adoção ainda que seja uma grande misericórdia. Ó, é uma poderosa misericórdia, mais alta que os montes, ser eleito por Deus desde toda eternidade, porem é uma verdade que seus redimidos são eleitos assim, e, portanto, cante motivado por isso. É uma profunda e indizível benção ser redimido com o precioso sangue de Cristo, mas você é redimido assim mais além de toda dúvida. Portanto, não duvide, antes, dê altos gritos pela alegria de seu coração. É um pensamento arrebatador que more acima, e que leve a coroa, e agite a rama de palma para sempre – que nenhuma desconfiança interrompa a melodia de seu salmo de expectação, e melhor ainda:

“Para a exaltação sonora do amor divino,
Peça a cada corda que desperte.”

Que plenitude de verdade há nessas poucas palavras: “Grandes coisas me há feito o Poderoso”. É um texto a partir que um espírito glorificado no céu poderia pregar um sermão sem fim. Peço-lhe que guarde os pensamentos que lhe sugeri dessa pobre maneira, e que trate de chegar ao sítio onde Maria esteve, gozando de santa exultação. A graça é grande, porem também o seu doador o é – o amor é infinito, e também o coração do qual brota – a bem-aventurança é indescritível, porem a sabedoria divina que a planejou desde tempos antigos também a é. Que nossos corações se apropriem do “Magnificat”, o “faça-se” da Virgem, e louvem ao Senhor muito alegremente nessa hora.

Ademais, posto que não esgotamos a melodia – a santidade de Deus esfriou o ardor do gozo do crente – porem não foi assim no caso de Maria. Ela se alegra nele: “Santo é seu nome”. Incorpora esse brilhante atributo em seu cântico. Santo Senhor, quando esqueço meu Salvador, o pensamento de Sua pureza me faz estremecer – quando estou onde Moises esteve no santo monte de Sua Lei, estou espantado e tremendo! Para mim, consciente de minha culpa, nenhum ribombar poderia ser mais terrível do que o hino do serafim: “Santo, Santo, Santo, Senhor Deus dos exércitos!” Que é Sua santidade senão fogo consumidor que tem que destruir-me completamente, sendo eu um pecador? Se os céus não são puros diante de Seus olhos, e notas necedade em Seus anjos, quanto menos então pode suportar ao homem vão e rebelde, nascido de mulher? Como pode o homem ser puro e como podem Seus olhos o ver sem rapidamente consumir-lhe em Sua ira? Porem, ó Tu, o Santo de Israel, quando meu espírito está no Calvário e pode ver Sua santidade vindicar-se a si mesma nas feridas do homem que nasceu em Belém, então meu espírito se alegra nessa gloriosa santidade que uma vez foi seu terror. Inclinou-se até o homem o três vezes santo Deus e assumiu a carne do homem? Então, em verdade, há esperança! Um santo Deus suportou a sentença que Sua própria lei pronunciou contra o homem? Esse Deus santo encarnado estende Suas feridas e intercede por mim? Então, alma minha, a santidade de Deus deve ser uma consolação para você. Extrairei águas vivas desse poço sagrado, e agregarei a todas minhas notas de júbilo essa outra: “Santo é seu nome”. Ele jurou por Sua santidade, e não mentirá, guardará Seu pacto com Seu ungido e com Sua semente para sempre.

Quando, como sobre asas de anjos, nos remontamos ao céu em santo louvor, a perspectiva se abre debaixo de nós – de igual maneira, quando Maria se cinge com a asa poética, olha ao longo das passagens do passado, e contempla os poderosos atos de Jeová nas eras transcorridas há muito tempo. Observem como a melodia adquire majestade – trata-se mais bem do vôo de Ezequiel, o de asas de águia, que da agitação da tímida pomba de Nazaré. Ela canta: “E a Sua misericórdia é de geração em geração sobre os que o temem.”. Olha mais além do cativeiro, aos dias dos reis, a Salomão, a Davi, através dos juízes e até chegar ao deserto, e através do mar Vermelho para Jacó, a Abraão, e segue seu transcorrido até que detendo-se na porta do Éden, ouve o som da promessa: “A semente da mulher ferirá a cabeça da serpente”. Quão magnificamente resume o livro das guerras do Senhor, e repassa os triunfos de Jeová: “Com o seu braço agiu valorosamente; Dissipou os soberbos no pensamento de seus corações.” Quão deleitávemente a misericórdia é mesclada com o juízo no seguinte canto de seu salmo: “Depôs dos tronos os poderosos, E elevou os humildes. Encheu de bens os famintos, E despediu vazios os ricos.”

Meus irmãos e irmãs, também cantemos do passado, glorioso em fidelidade, temível em juízo, fecundo em portentos. Nossas próprias vidas nos proporcionarão um hino de adoração. Falemos das coisas que experimentamos tocantes ao Rei. Estávamos famintos e Ele nos encheu de coisas boas – encurvou-se sobre o monturo com o mendigo, e nos entronizou entre os príncipes – fomos sacudidos pela tempestade, porem com Eterno Piloto ao timão, não tivemos medo de naufragar – fomos lançados dentro de um forno ardente, mas a presença do Filho do Homem apaziguou a violência das chamas.

Proclamem, ó vocês, filhas da música, a longa história da misericórdia do Senhor para com Seu povo nas gerações já passadas. As muitas águas não puderam apagar Seu amor, nem os rios afogá-lo – a perseguição, a fome, a nudez, os perigos, a espada, nada disso separou aos santos do amor de Deus, que é em Cristo nosso Senhor. Os santos, sob a asa do Altíssimo, sempre estiveram seguros. Quando foram mais assediados pelo inimigo, moraram em perfeita paz: “Deus é nosso amparo e fortaleza, nosso presente auxílio nas tribulações”. Atravessando às vezes a onda cor vermelha de sangue, o barco da Igreja não se desviou jamais de seu predestinado caminho de progresso. Cada tempestade favoreceu-a – o furação que buscava sua ruína se viu obrigado a levar ela adiante mais rapidamente. Sua bandeira desafiou nesses mil e oitocentos anos a batalha e a agitação, e não teme para nada o que possa sobrevir ainda. Porem, vejam aqui, aproxima-se ao porto – o dia está amanhecendo quando darão adeus às tormentas – as ondas se acalmaram sob ela – o repouso longamente prometido está à mão – Jesus mesmo encontra-se com ela, caminhando sobre a águas, entrará em seu porto eterno e todos os que vão a bordo cantarão de gozo com seu Capitão e triunfarão e cantarão vitória por meio Daquele que a amou e foi seu libertador.

Quando Maria afinou assim seu coração para glorificar a Deus nela por Suas maravilhas do passado, enfatizou particularmente a nota da eleição. A nota mais alta da escala de meu louvor é alcançada quando minha alma canta: “Eu amo a Ele, porque Ele me amou primeiro”. Kent o expressa muito bem dessa forma:

“Um monumento à graça.
É um pecador salvo pelo sangue;
Eu rastreou as correntes do amor


Até sua fonte: Deus;
E em Seu poderoso peito veio,
Eternos pensamentos de amor por mim.”

Dificilmente poderíamos voar mais alto do que a fonte do amor no monte de Deus. Maria sustenta a doutrina da eleição em seu cântico: “Depôs dos tronos os poderosos, E elevou os humildes. Encheu de bens os famintos, E despediu vazios os ricos.”. Ai percebemos à graça que distingue, a consideração que discrimina; ai, a alguns se lhes permite que pereçam; ali estão outros, os menos merecedores e os mais obscuros, que são feitos objetos especiais do afeto divino.

Não tenha medo de ressaltar essa excelsa doutrina, amado irmão no Senhor. Permita-me assegurar que quando sua mente está mais triste e caída, descobrirá que isso é um vaso que contêm o mais delicioso medicamento. Aqueles que duvidam dessas doutrinas, ou que as arrojam à fria sombra, perdem dos mais ricos ramos de Escol – perdem dos vinhos refinados e dos grossos tutanos, porem vocês que, em razão dos anos, tiveram seus sentidos exercitados para discernir entre o bem e o mal, vocês sabem que não existe mel como esse, não há uma doçura comparável a ele. O mel no bosque de Jonatas, quando era tocado, iluminava os olhos para ver, porem esse é o mel que iluminará seu coração para amar e aprender os mistérios do reino de Deus.

Comam, então, e não tenham medo de se enjoarem – alimentem-se dessa seleta delicia, e não tenham medo de se cansarem dela, pois quanto mais saibam, mais desejarão saber, quanto mais cheia estiver sua alma, mais desejarão que sua mente seja expandida, para poder compreender mais o amor de Deus que é eterno, imperecível e discriminador.

Porem, farei mais um comentário sobre esse ponto. Vocês vêem que Maria não terminou seu cântico até não ter chegado ao pacto. Quando se remonta até um ponto tão alto como a eleição, demore-se em seu monte irmão, que é o pacto da graça. No último verso de seu cântico, ela canta: “Como falou a nossos pais, para com Abraão e a sua posteridade, para sempre”. Para ela, esse era o pacto – para nós, que temos uma luz mais clara, o antigo pacto feito na câmara do conselho da eternidade, é o tema do maior deleite. O pacto com Abraão, em seu melhor sentido, só uma copia menor desse pacto de graça feito com Jesus, o Pai eterno dos fiéis, antes que os céus azuis fossem estendidos. Os compromissos do pacto são suaves almofadas para uma cabeça dolorida – os compromissos do pacto com a fiança, Cristo Jesus, são os melhores sustentadores de um espírito trêmulo:



“Seu juramento, Seu pacto, Seu sangue,
Sustentam-me na feroz inundação;
Quando todo apoio terrenal caia,
Segue sendo minha fortaleza e meu sustento.”

Se Cristo efetivamente jurou levar-me à glória, e se o Pai jurou entregar-me ao Filho para formar parte da infinita recompensa pela aflição de Sua alma, então, alma minha, enquanto Deus mesmo não seja infiel, enquanto Cristo não cesse de ser a verdade, enquanto o conselho eterno de Deus não se converta em mentiroso e o vermelho pergaminho de Sua eleição não seja consumido pelo fogo, você está segura. Descanse, então, em perfeita paz, venha o que venha; tire sua harpa de cima dos salgueiros e que seus dedos não parem de tocá-la seguindo os acordes da mais rica harmonia. Ó, que recebamos graça de principio à fim para nos unirmos a Maria em seu cântico.

II. Em segundo lugar, MARIA CANTA DOCEMENTE. Ela louva a Deus com todo seu coração. Observem como adentra até o centro do tema. Não há um prefácio, mas sim “Engrandece minha alma ao Senhor; meu espírito se alegra em Deus meu Salvador”. Quando algumas pessoas cantam, dão a impressão de que têm medo de ser ouvidas. Nosso poeta declara:

“Com todos meus poderes de coração e língua
Louvarei meu Criador em meu canto;
Os anjos ouvirão as notas que elevo,
Aprovarão o canto, e se unirão no louvor.”

Temo que os anjos frequentemente não escutam esses pobres sussurros, fracos e desfalecentes, que muitas vezes brotam de nossos lábios simplesmente pela força do costume. Maria é todo coração – evidentemente sua alma está ardendo – enquanto ela medita, o fogo arde, logo expressa sua emoção com palavras. Nós também devemos recolher nossos pensamentos dispersos, e devemos despertar nossos poderes adormecidos para louvar ao amor redentor. Maria usa uma nobre palavra: “Engrandece minha alma ao Senhor. Eu suponho que isso significa: “Minha alma se esforça por engrandecer a Deus por meio do louvor”. Ele é tão grande, como poderia ser em Seu ser – minha bondade não pode magnificar-lhe, porem minha alma deseja engrandecer a Deus nos pensamentos dos demais, e engrandecê-lo em meu próprio coração. Eu desejaria dar ao cortejo de Sua glória um maior alcance – eu desejaria refletir a luz que Ele me há dado – quisera converter em amigos a Seus inimigos, eu desejaria converter os pensamentos ásperos sobre Deus em pensamentos de amor. “Engrandece minha alma ao Senhor”. O velho Trapp disse: “minha alma desejaria criar um maior espaço para ele”. É como se Maria quisesse absorver mais de Deus, como Rutherford, quando disse: “Ó, que meu coração fosse tão grande como o céu, para que eu pudesse conter a Cristo nele!” – e logo, se coloca um ‘porem’ a si mesmo: “Porem, os céus e a terra não podem contê-Lo. Ó, que tivera um coração tão grande que sete céus, para poder assim conter a todo o Cristo dentro dele”. Verdadeiramente, esse é um desejo maior do que poderíamos jamais esperar que fosse cumprido, no entanto, nossos lábios cantarão ainda: “Engrandece minha alma ao Senhor.” Ó, se pudesse coroá-lo, se pudesse colocá-lo mais acima! Se o fato de que fosse queimado na fogueira pudesse acrescentar tão somente uma fagulha de mais luz para Sua glória, eu seria feliz por sofrê-lo. Se o fato de que eu fosse aplastado pudesse levantar um tantinho mais a Jesus, feliz seria a destruição que acrescentaria a Sua glória! Tal é o espírito de entrega do cântico de Maria.

Mais, seu louvor é muito alegre: “Meu espírito se alegra em Deus meu Salvador.” A palavra no grego é muito notável. Eu creio que é a mesma palavra que é usada na passagem: “Folgai nesse dia, exultai” (Lucas 6:23). Acostumávamos ter uma antiga palavra em inglês que descrevia a um certo baile de celebração, “a galliard” - uma galharda. Era um baile no que se dava saltos[1]; os antigos comentaristas o chamam um levante. Maria, de fato, declara: “Meu espírito haverá de dançar como Davi diante da arca, dará saltos, pulará, saltitará e regozijará em Deus meu Salvador”. Quando nós louvamos a Deus, não deveria ser com notas dolorosas ou melancólicas. Alguns de meus irmãos louvam sempre a Deus com a nota mais baixa, ou em profundo, profundo baixo – não podem se sentir santos enquanto não estejam melancólicos. Por que alguns homens não podem adorar a Deus exceto com uma cara larga? Os conheço por sua simples maneira de caminhar quando eles vêem à adoração: que passo terrível o deles! Não entendem o Salmo de Davi:

“A seus átrios, com gozos desconhecidos,
As sagradas tribos apelam.”[2]

Não, esses indivíduos sobem à casa de Seu Pai como que se dirigissem à cadeia, e adoram a Deus nos domingos como se fosse o dia mais triste da semana! Se diz de um certo habitante das zonas altas da Escócia – quando os habitantes dessa região eram muito piedosos – que uma vez esse tal foi a Edimburgo, e quando retornou de sua viagem comentou que tinha visto um terrível espetáculo ao domingo, pois tinha visto a certas pessoas em Edimburgo que iam à igreja com rostos alegres. Ele considerava que era perverso achar-se feliz aos domingos. Esse mesmo conceito existe nas mentes de certas boas pessoas daqui – imaginam que quando os santos se reúnem devem se sentar, e experimentar uma pequena e cômoda infelicidade e só um pouco de deleite. Em verdade, gemer e abater-se não é caminho designado para adorar a Deus. Devemos tomar a Maria como uma norma. Eu a recomendo todo ano como um exemplo para os que estão turbados e têm um coração desfalecente. “Meu espírito se alegra em Deus meu Salvador”.

Cessem de se alegrarem nas coisas sensuais, e não tenham nenhuma comunhão com os prazeres pecaminosos, pois todo esse regozijo é maligno, mas vocês não podem se alegrar em demasia no Senhor. Eu creio que o problema de nossa adoração pública é que somos demasiadamente sóbrios, frios e formais. Eu não admiro precisamente os abruptos rompantes de nossos amigos metodistas primitivos quando se desenfreiam, mas eu não colocaria nenhuma objeção a ouvir uma “ALELUIA!” dito de todo coração de vez em quando. Uma entusiasta explosão de exultação poderia acalentar nossos corações – o grito de “Glória!” poderia acender nossos espíritos.

Isso sei, que não me sinto mais pronto para a verdadeira adoração do que quando estou pregando no País de Gales, quando ao longo de todo o sermão o pregador é auxiliado, mais que interrompido, pelos gritos de: “Glória a Deus!” e “Bendito seja Seu nome!” Vamos, nesse momento o sangue começa a arder, e a alma de um é sacudida, e essa é a verdadeira maneira de servir a Deus com alegria. “Alegrem-se no Senhor, sempre, Outra vez digo: Regozijai-vos!” “Meu espírito se alegra em Deus meu Salvador.”

Em terceiro lugar, Maria canta docemente porque canta confiadamente. Não para a perguntar-se: “Tenho algum direito de cantar?”, mas bem diz: “Engrandece mina alma ao Senhor – e meu espírito de alegra em Deus meu Salvador. Porque olhou para baixeza de Sua serva”. O “se” é um triste inimigo de toda felicidade cristã – “porem”, “porventura”, “dúvida”, “conjecturar”, “suspeitar”, esses constituem uma raça de salteadores de meio de estrada que espiam aos pobres peregrinos tímidos e lhes roubam o dinheiro de seus gastos. As harpas pronto desafinam e quando sopra o vento desde o reduto da dúvida, as cordas se rompem ao menor toque. Se os anjos do céu pudessem abrigar alguma dúvida, isso converteria o céu em um inferno. “Se és Filho de Deus” foi a arma covarde brandida pelo antigo inimigo contra nosso Senhor no deserto. Nosso grande inimigo conhece bem qual arma é a mais perigosa.

Cristão, coloque o escudo da fé sempre que veja a adaga envenenada pronta a ser usada contra você. Temo que alguns de vocês alimentam suas dúvidas e temores. Bem poderiam incubar jovens víboras e criar um basilísco. Pensam que é um sinal de graça terem dúvidas, ainda que melhor é um sinal de debilidade. Se duvidam da promessa de Deus, isso não demonstra que não possuem nada de graça, porem demonstra, em verdade, que precisam de mais graça, pois se tivessem mais graça, receberiam a Palavra de Deus tal como Ele a dá, e se diria de vocês como se disse de Abraão, que “tampouco duvidou, por incredulidade, da promessa de Deus, mas sim que se fortaleceu em fé, dando glória a Deus, plenamente convencido de que era também poderoso para fazer tudo o que havia prometido.” Que Deus lhes ajudem a desfazerem-se de suas dúvidas. Ó, essas são coisas diabólicas! Essa é uma palavra muito dura? Encantar-me-ia encontrar uma mais dura. São criminais, são rebeldes que buscam roubar de Cristo Sua glória – são traidoras que lançam lama sobre o escudo de armas de meu Senhor. Ó, são vis traidoras – a alcem sobre a forca que deve ser tão alta como a de Hamã – lancem-nas por terra, e deixem que apodreçam como carniça, ou enterrê-las com o enterro de um asno! As dúvidas são aborrecidas por Deus e também devem ser aborrecidas pelos homens. São cruéis inimigas de suas almas, lesionam a sua utilidade e os despojam em todos os sentidos. Eliminem-nas com a espada do Senhor e de Gideão! Por fé na promessa busquem lançar fora esses cananeus e possuam a terra. Ó, vocês, homens de Deus, falem com confiança, e cantem com sagrado júbilo.

Há algo mais que confiança em seu cântico. Maria canta com grande familiaridade, Engrandece minha alma ao Senhor, e meu espírito se alegra em Deus meu Salvador... Porque me fez grandes coisas o Poderoso; Santo é seu nome”. Esse é o cântico de alguém que se aproxima muito de perto de seu Deus em amorosa intimidade. Eu sempre tenho uma ideia quando escuto a leitura da liturgia: que é a adoração de um escravo. As palavras e as frases não são um problema para mim. Talvez, de todas as composições humanas, o serviço litúrgico da Igreja da Inglaterra seja, com algumas exceções, o mais nobre, porem só é bom para escravos, ou, supondo o melhor, para súditos. Ao longo de todo o serviço, um sente que há um cerco que rodeia a montanha, tal como no Sinai. Sua “litania” é o lamento de um pecador, e não o feliz triunfo de um santo. O serviço gera uma escravidão, e não contêm nada do espírito confiante da adoração. Contempla ao Salvador desde muito longe, como alguém que há de ser temido mais bem que amado, e que deve ser considerado temível em lugar de deleitar-se Nele. Não tenho dúvida de que se adéqua àqueles cuja experiência os conduz a colocar os dez mandamentos próximos da mesa da comunhão, pois evidenciam por isso que seus tratos com Deus são ainda sobre os termos de servos e não de filhos.

No que a mim diz respeito, eu preciso de uma forma de adoração na que possa aproximar-me a meu Deus, e acercar-me inclusive a Seus pés, expondo meu caso diante Dele, e ordenando minha causa com argumentos, falando com Ele como um amigo fala com seu amigo, ou um filho fala com seu pai – de outra forma, a adoração vale muito pouco para mim.

Nossos amigos da Igreja Episcopal, quando vêem aqui, são naturalmente impactados pelo nosso serviço, o vendo como irreverente porque é muito mais familiar e atrevido que o seu. Temos de nos guardar cuidadosamente de ter que merecer realmente essa critica, e então não deveríamos temê-la, pois uma alma renovada deseja vivamente precisamente esse tratamento que o formalista chama irreverente. Falar com Deus como meu Pai, tratar com Ele como com Um que cujas promessas são verdadeiras para mim, e a quem eu, um pecador lavado no sangue e vestido com a justiça perfeita de Cristo, posso vir com valor, sem ter que ficar ao longe. Eu digo que isso é algo que o adorados dos átrios exteriores não pode entender.

Há alguns de nossos hinos que falam de Cristo com tal familiaridade que o crítico impassível diz: “Não gosto de tais expressões. Eu não poderia cantar elas”. Estou plenamente de acordo contigo, senhor crítico, já que a linguagem não lhe conviria bem a você, posto que é um estranho, porem, um filho pode dizer mil coisas que um servo não pode. Lembro que um ministro alterou um de nossos hinos que diz:

“Que recusem cantar
Os que jamais conheceram nosso Deus;
Porem, os favoritos do Rei celestial
Podem expressar livremente seus gozos”.

Ele mudou dessa maneira:

“Porem, os SÚDITOS do Rei celestial.”

Sim, e quando o expressou, eu pensei: “isso é correto, você está cantando o que sente – você não sabe nada da graça que discrimina nem das manifestações especiais, e portanto, se apega a seu nível inato, que é de súdito do rei celestial”. Porem, ó, meu coração necessita de uma adoração que possa sentir e expressar o sentimento de que sou um favorito do rei celestial, e que portanto, posso cantar de Seu amor especial, de Seu favor manifesto, de Suas doces relações e de Sua misteriosa união com minha alma. Nunca estará bem enquanto não lhe faça a pergunta: “Senhor, como é que se manifesta a nós, e não ao mundo?” Existe um segredo que nos é revelado, e que não é revelado ao mundo exterior – um entendimento que as ovelhas recebem, porem que as cabras não recebem. Eu apelo a qualquer de vocês que durante a semana ocupam uma posição oficial: um juiz, por exemplo. Você tem um assento no tribunal e não está revestido de uma insignificante dignidade quando está ai. Quando chega em casa, você tem um pequenino que tem muito pouco medo de sua investidura de juiz, ainda que tem muito amor por sua pessoa, e que sobe em seus joelhos, lhe beija na bochecha e lhe diz mil coisas que são adequadas e corretas porque saem dele, porem que você não toleraria na corte se proviessem de qualquer outro ser vivente. Essa parábola não necessita de interpretação.

Quando leio algumas das orações de Martinho Lutero, escandalizo-me, porem argumento comigo mesmo assim: “É certo que não posso falar com Deus da mesma maneira que Lutero, porem, talvez, Lutero sentiu e compreendeu sua adoção mais do que eu o faço, portanto, não era menos humilde porque fosse mais arrojado. Poderia ser que usou expressões que estavam fora de lugar na boca de qualquer homem que não tivesse conhecido ao Senhor como ele o fez.”

Ó, meu amigo, cante nesse dia de nosso Senhor Jesus Cristo, como de alguém próximo a nós. Acerque-se a Cristo, leia Suas feridas, mete a mão em Seu lado, e coloque seu dedo no sinal dos cravos, e logo seu canto adquirirá uma sagrada doçura e uma melodia que não se pode conseguir em nenhuma outra parte.

Devo concluir observando que ainda que seu cântico era tudo isso, no entanto, quão humilde foi, em verdade, e que repleto de gratidão. Os papistas a chamar: “Mãe de Deus”, porem ela não sussurra jamais tal coisa em seu cântico. Não, melhor, ela diz: “Deus meu Salvador” – justo as mesmas palavras que o pecador que as fala poderia usar, e tais expressões como as que vocês, pecadores, que estão escutando-me, poderiam usar também. Maria necessita de um Salvador – sente que o necessita e sua alma se alegra porque há um Salvador para ela. Ela não fala como se pudesse se recomendar diante Dele, mas que espera ser aceita no amado. Procuremos, então, que nossa familiaridade esteja mesclada sempre com a prostração mais humilde de espírito, quando lembramos que Ele é Deus sobre tudo, bendito para sempre, e nós somos nada senão pó e cinzas. Ele enche todas as coisas, e nós somos menos que nada e vaidade.

III. O último deveria ser a pergunta: DEVE CANTAR SOZINHA? Sim, deve fazê-lo, se a única musica que podemos trazer é a dos deleites carnais e dos prazeres mundanos. Haverá muita musica amanhã que não encaixaria com a sua. Haverá muito júbilo amanhã, e muita risada, mas temo que a maior parte disso não iria de acordo com o cântico de Maria. Não será: “Engrandece minha alma ao Senhor; e meu espírito se alegra em Deus meu Salvador”. Não desejaríamos impedir as brincadeiras dos espíritos animais nos jovens nem nos velhos – não moderaríamos no mais mínimo seu júbilo das misericórdias de Deus, entanto que não quebrantem seu mandamento por conta do desenfreio, da bebedeira ou o excesso; porem, ainda assim, quando praticaram a maior parte desse exercício corporal, de pouca se aproveita, pois é só o desfrute da hora passageira e não a felicidade do espírito que é permanente – e, portanto, Maria deve cantar sozinha no que concerne a vocês. A alegria da mesa é demasiadamente baixa para Maria; o gozo da festa e da família é rasteiro comparado com o seu.

Porem, Maria deve cantar sozinha? Certamente não, se nesse dia qualquer de nós, pela simples confiança em Jesus, pudesse receber a Cristo para ser seu. O Espírito Santo lhe conduz a dizer nesse dia: “Confio minha alma a Jesus?

Meu querido amigo, então você concebeu a Cristo – no melhor sentido e no sentido místico da palavra, Cristo Jesus é concebido em sua alma. O compreende como o que carregou o pecado e quitou a transgressão? Pode ver a Jesus sangrando como o Substituto dos homens? O aceita como tal? Coloca toda sua fé na dependência no que Ele fez, no que é e no que faz? Então, Cristo é concebido em você, e pode prosseguir seu caminho com toda essa alegria que Maria conheceu – e eu estava quase pronto a dizer com algo mais – pois a concepção natural do santo corpo do Salvador foi, como tema de congratulação, só a décima parte se lhe compara com a concepção espiritual do santo Jesus dentro de seu coração, quando Ele seja em você a esperança da glória.

Meu querido amigo, se Cristo é seu, não há cântico na terra tão sublime e tão santo para ser cantado – e mais, não há nenhum comovedor cântico procedente dos lábios dos anjos, nem nenhuma nota comovedora da língua do arcanjo, aos que você não pudesse unir-se. Mesmo nesse dia, o mais santo, o mais feliz, o mais glorioso das palavras, dos pensamentos e das emoções, lhe pertencem. Usá-los! Que Deus lhe ajude a desfrutar de tudo isso, e Dele seja o louvor e teu seja o consolo para sempre. Amém.

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ORE PARA QUE O ESPIRITIO SANTO USE ESSE SERMÃO PARA EDIFICAÇÃO DE MUITOS E SALVAÇÃO DE PECADORES.

Todo direito de tradução protegido por lei internacional de domínio público e com permissão de Allan Roman do espanhol
Sermão El Cántico de María , nº 606—Volume 10 do The Metropolitan Tabernacle Pulpit,
Original em inglês:  Mary’s Song
Tradução e revisão: Armando Marcos Pinto
FONTE: Projeto Spurgeon: proclamando a Cristo crucificado

[1] A galharda (inglés= galliard,) foi una forma musical e dança do Renascimento, popular em toda Europa no Século XVI. Foi o baile favorito da rainha Elizabeth I de Inglaterra.
[2] Spurgeon diz: They do no understand David’s Psalm: “Up to her courts with joys unknown, The sacred tribes repairNão encontrei por meio de minhas ferramentas usuais a que Salmo ele se refere, pelo que a tradução é minha (Nota de Allan Roman, tradutor do sermão do inglês ao espanhol, base dessa tradução)